segunda-feira, 17 de abril de 2006

Atrás do Trio Elétrico

Enquanto em Salvador, no carnaval de 69, o povo cantava e dançava “Atrás do Trio Elétrico”, seu autor vivia no Rio a expectativa de ser libertado da prisão, imposta pela ditadura. A libertação aconteceu realmente na quarta-feira de cinzas, só que de forma parcial, pois, como foi dito acima, Caetano Veloso e Gilberto Gil passaram a um regime de confinamento na Bahia, seguindo-se o exílio em Londres.

Com esta marcha-frevo — mais tarde o gênero foi alcunhado de frevo baiano, sendo um frevo acelerado —, o compositor homenageava o Trio Elétrico Dodô e Osmar, que deu uma nova feição ao carnaval da Bahia. Entusiasmados com a exibição do grupo de frevo pernambucano Vassourinhas nas ruas de Salvador, em 1949, o rádio-técnico Dodô (Adolfo Antônio do Nascimento, morto em 16.6.78) e Osmar (Osmar Macedo, um virtuose no bandolim, morto em 30.6.97, e pai do também bandolinista Armandinho) saíram no carnaval de 50 sobre um velho carro Ford, equipado com dois alto-falantes, tocando guitarra e bandolim de madeira maciça, eletrificados, uma criação de Dodô, logo chamados de paus-elétricos ou guitarra baiana. A repercussão da novidade, bem maior do que se poderia esperar, os levou a ampliar o equipamento (para oito alto falantes) e transformar o duo em trio, com a inclusão do percussionista Temístocles Aragão. Nascia assim, em 1951, o Trio Elétrico Dodô e Osmar.

Caetano intuiu a projeção que a sua marcha-frevo daria ao carnaval baiano com uma letra cujo primeiro verso se tornou quase um dito popular: “Atrás do trio elétrico só não vai quem já morreu / quem já botou pra rachar aprendeu / que é do outro lado do lado de lá, do lado que é lá do lado de lá...” A simples leitura desses versos confunde quem não conhece a melodia, porque as sílabas “la” e “do” (cada uma repetida sete vezes) recaem ora em tempo forte, ora em tempo fraco, dando a sensação de haver uma síncope que a rigor não existe nesse trecho de cinco compassos. E mais: “la” e “lá” são ao mesmo tempo a primeira sílaba do substantivo “lado” e o advérbio “lá”, provocando assim um efeito paronímico. Esses truques rítmicos e prosódicos constituem uma atração a mais na obra de Caetano, aparecendo com certa freqüência, como em “Chuva, Suor e Cerveja”, de 1972.

Gravada inicialmente num compacto, em dezembro de 68, com o autor acompanhado por um pequeno grupo dirigido por Rogério Duprat, “Atrás do Trio Elétrico” logo começou sua escalada para se consagrar como um hino ao trio elétrico, esta instituição que transcendeu as fronteiras da Bahia e até as do próprio carnaval (A Canção no Tempo – Vol. 2 - Jairo Severiano e Zuza Homem de Mello – Editora 34).

Atrás do Trio Elétrico (frevo, 1969) - Caetano Veloso
F             Gm
Atrás do trio elétrico
C F
só não vai quem já morreu
Dm Gm
Quem já botou pra rachar
C
aprendeu
Gm
Que é do outro lado,
C
do lado de lá
Gm C F
Do lado que é lá do lado de lá.

(Repete refrão)

O Sol é seu, o som é meu
Gm
Quero morrer,quero morrer já
C7/9
O som é seu,o sol é meu,
F
Quero viver, quero viver lá
Nem quero saber se o diabo
Cm
nasceu
F7 Bb
Foi na Bahia, foi na Bahia
F
No trio elétrico o sol rompeu
C7/9
No meio-dia, no meio di-a.

(Repete refrão)

F Gm C Dm C7/9
Cm F7 Bb

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